Levantamento realizado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e pelo Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e Institutos de Pesquisa (Confies) mostra que, por causa da burocracia governamental, os cientistas brasileiros dedicam, em média, mais de 30% do tempo de estudo com a gestão administrativa de seus projetos. Segundo o levantamento, a burocracia é tão excessiva que, em determinadas áreas, a demora na aquisição de insumos básicos acaba inviabilizando a execução dos projetos.

 

“O problema do País não é apenas a falta de recursos. É, também, a falta de agilidade para promover a relação entre o governo, as universidades e as empresas para gerir os recursos. O Brasil tem uma qualidade muito boa de pesquisa, mas não consegue transformar o conhecimento em bens e serviços”, afirmou, ao jornal O Globo, Fernando Peregrino, presidente do Confies e diretor de orçamento e controle dos programas de pós-graduação em engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Entre os entraves burocráticos, o pesquisador Oscar Rosa Matos, coordenador do Laboratório de Ensaios Não Destrutivos, Corrosão e Soldagem da mesma universidade, aponta as dificuldades para alterar a alocação de verbas destinadas a pessoal para despesas de custeio e para adquirir insumos não previstos originalmente no projeto. “Processos aparentemente simples exigem solicitações demoradas e não seguem a rapidez exigida pela pesquisa. Se quisermos montar um equipamento e, durante o processo, chegarmos à conclusão de que para montá-lo precisaremos não de dez, mas de cinco parafusos, além da compra de dois voltímetros, não podemos. A burocracia exige previsão de tudo o que vai acontecer, o que é incompatível com a ideia de pesquisa”, disse Matos ao jornal.

 

Dos 301 cientistas ouvidos pelo levantamento do MCTIC e Confies, 207 lembraram que, nos últimos anos, a quantidade de formulários exigidos para concessão de apoio financeiro a cada projeto aumentou 63%. Esse aumento colide com os objetivos da Emenda Constitucional n.º 85. Aprovada em fevereiro de 2015, ela determina que a pesquisa e a inovação tecnológica recebam “tratamento prioritário nas diversas esferas de governo”. Também prevê que a União, os Estados e os municípios atuem em regime de colaboração para implementar o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI). E introduz critérios mais flexíveis para remanejamento de recursos no desenvolvimento das pesquisas. Segundo o levantamento, 64% dos projetos em andamento têm financiamento público.

 

Como o Brasil precisa investir cada vez mais em desenvolvimento científico e tecnológico para voltar a crescer e ganhar competitividade no comércio internacional, é preciso modernizar a gestão administrativa em todas as áreas, seja simplificando a burocracia alfandegária para a entrada de insumos necessários às pesquisas, seja reduzindo o tempo médio de duração de um processo de pedido de patente no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), estimado em 11 anos. No primeiro caso, entidades como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior estão realizando reuniões como MCTIC para discutir um decreto que reduza a burocracia no financiamento de projetos e permita que o remanejamento de recursos de uma categoria de gasto para outra seja feito a qualquer momento, desde que a justificativa seja apresentada na prestação de contas. No segundo caso, o MCTIC prometeu investir na informatização dos registros de patentes e convocar pesquisadores já aprovados em concurso para diminuir o tamanho da fila no Inpi.

 

A simplificação de procedimentos não significa revogação de controle, por parte do poder público. Significa, sim, a criação de mecanismos regulatórios mais flexíveis e condizentes com as atividades de pesquisa científica, que são dinâmicas e cambiantes por natureza.(EDITORIAL ESTADÃO <http://topicos.estadao.com.br/editorial-estadao> )