José Goldemberg, ex-reitor da USP e futuro presidente da Fapesp
Por que o senhor aceitou o cargo de presidente da Fapesp?
Acho que esse desafio que me foi apresentado pelo governador (presidir a Fapesp) me atraiu porque sei perfeitamente das dificuldades financeiras pelas quais estão passando as universidades paulistas. E uma das poucas alternativas para garantir a continuidade das pesquisas dentro das universidades é garantir uma Fapesp forte. Quando fui reitor da USP, introduzi reformas importantes na universidade. Esse novo desafio representa de uma certa maneira a continuidade do meu trabalho na USP. Isso me motivou mais que qualquer outra coisa.
Enquanto a situação financeira das universidades estaduais é grave, a Fapesp tem apresentado receitas maiores a cada ano. Qual é a razão desse contraste?
A Fapesp tem receita de aproximadamente R$ 1 bilhão por ano, com base em um porcentual garantido pela legislação paulista. Essa característica está no DNA da Fapesp desde o início de suas atividades em 1962, de modo que ela fica livre de flutuações e contingenciamentos. Além disso, a fundação tem desde o início um dispositivo que é o precursor da responsabilidade fiscal: pelo regimento, a Fapesp não pode gastar mais de 5% de seu orçamento para custeio operacional. A falta desse dispositivo é que levou as universidades públicas paulistas à situação dramática que vivem agora. Com isso, a Fapesp se mantém por mais de 50 anos como uma instituição estável, que desenvolveu procedimentos administrativos adequados, que lhe permitiram bancar praticamente toda a pesquisa das universidades e institutos de pesquisas de São Paulo.
Que desafios o senhor espera encontrar no caminho?
O primeiro desafio é que será preciso fazer um esforço para compensar as perdas de receita que poderão ocorrer com uma eventual queda da arrecadação, em consequência da crise financeira que estamos atravessando. A expectativa é de que a crise seja provisória e o PIB volte a crescer. Mas, nesse meio tempo, realmente vou fazer um esforço para tentar identificar outras fontes de financiamento que possam compensar as perdas.
De onde poderiam vir esses recursos suplementares?
Pelo estatuto da Fapesp, ela pode receber doações. Gostaria de motivar as pessoas bem-sucedidas que passaram pelas universidades paulistas – e fizeram seu trabalho graças ao apoio da Fapesp – a aderir a esse tipo de prática. No Brasil esse hábito não é difundido, mas no exterior é tradição que muitas agências de fomento e instituições de pesquisa recebam doações importantes de pessoas que delas se beneficiaram. Hoje está em discussão no Congresso Nacional um aumento de impostos sobre heranças, que são muito baixos no Brasil. Com impostos mais altos, como ocorre nos Estados Unidos, teríamos uma excelente ocasião para motivar essas pessoas a fazer doações.
O senhor tem planos para aumentar os investimentos da Fapesp em alguma área específica do conhecimento?
O estatuto da Fapesp determina que, além de distribuir recursos para atividades de pesquisas, ela deve fazer estudos para identificar áreas nas quais é necessário induzir mais trabalhos de investigação científica. Em lugar de apenas responder às demandas dos pesquisadores, a Fapesp tem a obrigação estatutária de identificar gargalos importantes para a sociedade e tentar resolvê-los com ciência. Vamos seguir nessa linha. Um exemplo: a dengue se tornou um grande problema em São Paulo. Há muitos cientistas estudando soluções, mas a Fapesp poderia aglutinar esse esforço com parcerias com a Secretaria de Estado da Saúde, por exemplo.
A Fapesp é o principal financiador de ciência no Estado de São Paulo, que responde por cerca de 50% dos artigos em revistas científicas no Brasil. Podemos dizer que a responsabilidade da fundação extrapola o Estado?
A Fapesp é uma fundação importante mesmo a nível internacional. A quantidade de recursos que ela desembolsa por ano em bolsas e pesquisas é aproximadamente igual à que é desembolsada pela Fundação Rockefeller, nos Estados Unidos, que tem enorme influência na pesquisa mundial. A Fundação Rockefeller, no passado, deu início à Faculdade de Saúde Pública de São Paulo e, na década de 50, instalou aceleradores para pesquisas nucleares no Brasil. No Estado de São Paulo, a Fapesp cumpre uma função parecida. Uma fundação que aplica seus recursos de uma maneira inteligente pode ter um grande impacto no desenvolvimento cientifico e social do País.